sábado, 17 de março de 2012

PROJETO: AVÓS RECORDANDO E NETOS APRENDENDO





    Resgatar as crenças, costumes e valores das famílias fazem com que a criança pense sobre si mesma, a realidade a sua volta e as relações estabelecidas entre o homem e o meio. Isto possibilita a ela, observar, analisar, refletir e comparar como a sociedade vai transformando-se historicamente. É no presente e no passado que se busca a compreensão da totalidade histórica.

domingo, 4 de março de 2012

TEORIA E PRÁTICA: UM DIÁLOGO CONSTANTE NA FORMAÇÃO DO PROFESSOR PESQUISADOR

                                                           RAMOS, Paulo. A formação do professor na perspectiva da metadisciplinaridade. Massaranduba: IESAD, 2008
                                                                                                                                             
O texto de um livro de literatura infantil, Nicolau tinha uma ideia... de Ruth Rocha, descreve com simplicidade a postura que promove o diálogo que deveria existir entre teoria e prática mostrando para o professor que ele não é apenas um profissional da prática, mas também da teoria.  “Era uma vez um lugar onde cada pessoa só tinha uma ideia na cabeça. [...] Um dia, apareceu um homem chamado Nicolau. [...] Logo que Nicolau chegou, foi procurar João. E contou sua ideia a ele. E João ficou com duas ideias na cabeça. João contou a ideia dele para Nicolau. E Nicolau ficou com duas ideias na cabeça. Aí, Nicolau foi contar sua ideia para Maria. E Maria ficou com duas ideias na cabeça. E contou a Nicolau a ideia dela. Nicolau ficou com três ideias na cabeça. Nicolau falou com Pedro, com Manuela e uma porção de gente mais. Nicolau ficou cheio de ideias. E as ideias de Nicolau começaram a se misturar umas com as outras e a formar muitas outras ideias. Então, as pessoas começaram a achar que era muito divertido ter muitas ideias na cabeça. [...] E naquele lugar, agora, todo mundo tem uma porção de ideias.”
A simplicidade da história ajuda a entender a essência do diálogo que deveria ocorrer na educação. E entender essa essência, na prática, consiste em conseguir que, o conhecimento pedagógico especializado se autentica, na prática, por meio dos processos de reflexão, acessibilidade e observabilidade, já que um fator importante na capacitação profissional é a atitude do professor de planejar sua tarefa docente baseando-se nas concepções filosóficas, psicológicas e pedagógicas que deverão ser o alicerce do projeto pedagógico da instituição. (RAMOS, 2008) 
Prática e teoria não devem caminhar isoladas, o professor precisa conhecer a teoria e levá-la para sala de aula para poder basear-se nela para analisar e resolver as situações que acontecem durante o processo educativo. Novamente nos deparamos com a importância do diálogo na ação pedagógica, em momento algum o professor pode caminhar sozinho ou guardar suas ideias para o trabalho individual em sala. 
Ramos traz uma discussão dos anos 90 sobre o debate que cerceou a problemática da formação do professor-pesquisador, uma vez que se passou a dar maior importância à desmistificação da ideia de que a pesquisa seria algo ao alcance apenas de alguns eleitos, preferencialmente alocados na universidade. Deste modo, a defesa da formação do professor investigador teria o objetivo de articular teoria e prática pedagógica, pesquisa e ensino, reflexão e ação didática.
A universidade não prepara o professor para conhecer a teoria, lança durante o processo acadêmico pequenos fragmentos teóricos e em grande quantidade com enormes apostilas de vários teóricos sem o tempo mínimo de conhecer um pouco sobre o que está estudando.
Para Ramos pensar a formação inicial e a formação em serviço do professor, é pensar na sua própria identidade como agente mediador do conhecimento. Não devemos pensar o trabalho do professor como um trabalho mecânico e reprodutor dos meios sociais; temos que modificar as estruturas tão necessárias à educação em nosso país.
O professor ainda não tem consciência da sua importância em sala de aula, em muitos momentos é acomodado e não se percebe como agente mediador do conhecimento. Muito ainda se dá a sua formação inicial, como foi preparado durante o início da vida escolar aonde não podia emitir nenhuma opinião, professor falava e o aluno fingia que ouvia e entendia. Os assuntos eram passados e tidos como verdades sem promover diálogos e questionamentos ficava calado e admirado com todo o saber que o professor achava que tinha, pois também vinha de uma escola que detinha todo o conhecimento. Mas, hoje sentimos necessidade e urgência de uma nova postura do professor a escola não possui todo o conhecimento e o professor não é apenas um profissional da prática ele precisa da teoria para deixar de falar: “Eu tenho bastante prática e sei o que estou fazendo”.
O novo professor, uma exigência da sociedade moderna, é um sujeito que busca uma formação em serviço, pois ele é desafiado a criar grandes projetos de conhecimento aliados à pesquisa, vivenciando na sala de aula a realidade do aluno. A busca pelo conhecimento demanda sua criação e a participação efetiva dos alunos.
O professor não percebe que através do comprometimento com sua formação poderá observar melhor e auxiliar seus alunos em sala de aula, utilizar verdadeiramente os conhecimentos adquiridos durante sua caminhada acadêmica em benefício do aluno. E não simplesmente passar pela universidade como turista sem perceber o “por que” de estar ali.
 Conforme pontuou Pimenta (1995), a formação do professor não se esgota nos cursos de formação, pois um curso não compreende todos os preceitos metodológicos requeridos na prática pedagógica.
O que se percebe nas conversas de muitos professores é que o aluno não conta nesse processo de aprendizagem, mas que o mesmo acaba não aproveitando “tudo” o que o professor adquiriu de conhecimento na sua formação. O aluno não consegue mais “engolir” todo o conhecimento que o professor acha que tem para ensinar. O professor não percebe que o aluno pede por uma mudança em sua postura e continua frustrado em seu trabalho acreditando que a nova geração não quer nada com nada. Porém, se o professor olhasse realmente para o aluno veria um sujeito carente de conhecimento e diálogo e só assim conseguiria modificar sua prática com o auxílio das teorias estudadas durante seu processo de formação.
O “ser professor”, quando comprometido com sua profissão, é um ser que se defronta diariamente com o desafio de inovar sua práxis. É um ser que não esquece os problemas como um simples apertar botões. Ser professor exige identidade, vocação e significação daquilo que se busca oferecer à sociedade por meio da profissão. (KIECKHOEFEL, 2207). 
Professor é envolver-se com a profissão, muito mais do que entrar em sala de aula e fingir que está exercendo a profissão. É apaixonar-se a cada dia pelo que faz, orgulhando-se dos desafios que consegue vencer junto com seus alunos baseando-se sempre em pesquisas e na prática adquirida durante sua caminhada na educação. Professor não pode pensar que aprendeu o suficiente, deve caminhar sempre buscando novos conhecimentos e trocando com os sujeitos que estão ao seu redor.
Ramos coloca que aprender e ensinar auxilia o professor no seu ofício diário de planejar e refletir sobre as atividades da sala de aula. Ademais, traz informações variadas e oferece soluções criativas para que o mesmo emancipe ao emancipar-se.
Mesmo que as condições nas instituições em que o professor atue não favoreçam grandes e maravilhosos trabalhos ele precisa pensar e criar em cima do que tem buscando sempre inovar o que irá trabalhar com seus alunos. Olhar para sua sala de aula e perceber que atividades adequadas à realidade e as reais necessidades dos alunos irá desenvolver, para que todos consigam acreditar que podem aprender. Ser um constante pesquisador e utilizar-se de seus conhecimentos para sempre planejar sua prática diária. A formação não se constrói por acumulação de cursos, conhecimentos ou técnicas, mas por meio de um trabalho de reflexão crítica, em serviço, sobre a prática. (RAMOS, 2008)
Vemos em muitos momentos professores orgulhosos de seus títulos e cursos, mas na sala de aula e até mesmo com os colegas de trabalho não sabem o que fazer com tanto conhecimento adquirido. O diálogo precisa acontecer entre o que se conhece e o meio que está inserido para que todo o conhecimento que se busca tenha realmente seu valor, pois, só se tornará útil trocando as ideias com o outro. O conhecimento não pode ficar acumulado e “parado” nas mentes ele precisa circular para renovar-se sempre.
Para Piaget (1970), a formação de professores é longa e complexa, uma vez que é importante ao professor tomar consciência do que faz ou pensa a respeito de sua prática pedagógica, numa perspectiva crítica das atividades e procedimentos implementados na sala de aula, bem como dos valores culturais de sua função, adotando uma postura de pesquisador e não apenas de transmissor, tendo em vista um melhor conhecimento acerca dos conteúdos escolares e das características do desenvolvimento e aprendizagem de seus alunos.
Ser professor é muito complexo, diferente do que muitos pensam. Estar na sala de aula é doar-se plenamente e não apenas fingir que é um educador. O professor é um sujeito que vive aprendendo, seu conhecimento não está pronto e acabado e isto deve estar bem claro para ele durante sua trajetória na educação. Refletir sua prática com o olhar nas teorias estudadas deve fazer parte do cotidiano do professor, não acomodar-se com o sistema de ensino que aí está, e sim querer aprender sempre e mais para que os alunos possam participar desse processo de formação. O professor sujeito direto e responsável pelo diálogo entre teoria e prática precisa deixar estes momentos se unirem para poder fazer de sua sala de aula um verdadeiro laboratório de conhecimento, saber o que fazer dentro da sala com tudo o que busca durante sua formação contínua. Olhar o aluno como sujeito que “está” naquele momento, mas que através da troca e interação irá evoluir sempre mais.
 O professor pode ser visto como o Nicolau que ao chegar à sua “cidade”, a sala de aula deve passar sua ideia para os outros e juntos se alimentar de novas ideias, sempre tendo em mente que com apenas uma ideia não se consegue chegar longe.
                                             
                                                                      Rosania Soares Carminati
                                                                                       










 

    




REFLEXÕES SOBRE UMA PRÁTICA DOCENTE INTERDISCIPLINAR PARA A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO

A leitura da apostila trouxe muitas reflexões sobre a disciplina Práticas Disciplinares que remeteram meus pensamentos a uma frase lida há muito tempo e de um grande gênio do cinema chamado Charles Chaplin que diz: “Não sois máquinas! Homens é o que sois!” E a partir da frase deste grande gênio do cinema é que vejo grande semelhança com muitas das reflexões sugeridas pela autora quando refere-se a uma educação que parte da singularidade rumo à universalidade do conhecimento, respeitando o sujeito como alguém que pensa, age, tem sentimentos e é capaz de construir-se ao longo do processo da própria existência. Penso que seria realmente mais fácil se acontecesse na sala de aula o que lemos nas teorias, mas infelizmente muitos professores tratam os alunos como máquinas que precisam produzir preenchendo páginas de livros e trabalhando conteúdos fora de seus contextos.
Voltando a frase de Chaplin paro diante do pensamento da autora sobre a reflexão que o professor deve fazer diante do espelho sobre as atitudes que assume em suas ações e lança várias perguntas que o professor deverá fazer sobre sua prática para descobrir o significado de uma ação interdisciplinar. Muitos professores não param para pensar sobre suas ações, percebemos isso quando um professor nem se dá ao trabalho de preparar seu planejamento e vai para sala de aula sem saber o que fará com os alunos.
Para Dra. Diva a teoria da interdisciplinaridade insiste na relevância de “habitar” o conceito, torná-lo seu, após estudo, reflexão, contextualização no tempo e no espaço, comparações, críticas. Assim, ao transformá-lo em conhecimento possamos devolver-lhe o grau de saber, após travestirmo-nos com / de sua sabedoria.
Para que se possa fazer toda a desconstrução de um conceito que nos foi imposto sem questionar o professor precisa assumir uma postura dinâmica e reflexiva que vai além da sua formação de professor, só assim poderá responder às novas exigências de mudanças de caráter subjetivo e objetivo na resignificação da sua identidade profissional.
Sentir e viver a afetividade na educação, pela teoria da interdisciplinaridade suscita que nosso eu adentre a sala de aula, inteiro, para desvelar, descobrir e sentir as manifestações presentes nas interações, relações e reações que os sujeitos estabelecem/ manifestam na ação de educar.
Um professor que afete seus alunos com o prazer que sente pela educação e a partir daí contagia seus alunos com os conceitos que reconstruiu e não uma simples máquina que por pura obrigação transmite para os alunos o seu “verdadeiro” conceito. Ter prazer em preparar algo significativo para que juntos professor e alunos possam exercitá-lo. Sentir se o aluno realmente entendeu o que você quis dizer e respeitar as suas dificuldades para poder durante o processo poder saná-las.
Para Dra diva uma ação deve ser consciente, partilhada e envolvente, visto que, os sujeitos devem se apresentar inteiros para que esta ação seja significativa e com sentido à sua existência
Professor esquece-se desses detalhes que fazem a diferença e simplesmente entra na sala de aula sem envolver-se para que os alunos também possam ficar envolvidos e o trabalho seja um crescimento mútuo.
A autora escreve sobre o movimento do currículo não como um ato mecânico, mas intimamente ligado à realidade da sala de aula, reconstruído com um olhar crítico, considerando os diferentes saberes produzidos ao longo da história. É, nessa relação, entre sujeito e conhecimentos, inseridos no movimento da macro e da micro-história, que o currículo ganha vida.
A escola muitas vezes caminha contra este movimento do currículo, ignorando em muitos momentos as diferenças em sala de aula, desprezando como se dá o caminhar entre os sujeitos (professor/aluno).
Segundo a teoria da interdisciplinaridade não se joga o velho fora, ou seja, não se abandona a forma em que o currículo disciplinar está organizado. Mesmo porque para desenvolver um currículo interdisciplinar faz-se necessário as disciplinas. Na interdisciplinaridade o velho é o ponto de partida para se construir o novo, neste caso uma nova forma de organizar e trabalhar com os conhecimentos escolares.
Concordo com a afirmação de não jogar fora o que aí está, pois aprendemos com o “velho” e como profissional temos que ter a capacidade de desafiar e transformar a partir do que já existe. Transformar a sala de aula em um grande laboratório de conhecimento e pesquisa, aonde os sujeitos a partir do que existe aperfeiçoam e trocam conhecimentos.
A autora traz através da escrita de Fazenda (2001) uma reflexão sobre projetos interdisciplinar, que diz só ser possível pensar em projeto interdisciplinar a partir de uma prática interdisciplinar. Toda prática está ligada a uma ação, porém, existem diferentes modalidades de ação: a ação reflexiva e a ação praxiológico. Ao se pensar numa ação de nível reflexivo, a metodologia suscita que se pergunte: o quê. Meu pensamento visualiza um produto prático de natureza científica. Contudo, ao pensar no nível praxiológico, pergunta-se: como? Nesta dimensão o centro de preocupação é o processo vivido, por isso, essa modalidade de ação está voltada à construção epistemológica do conhecimento.
O que muitos professores não conseguem perceber dentro da educação é uma urgência de mudança da sua prática que leve o aprender a aprender para que ocorra o crescimento nas ações pedagógicas surgindo a partir daí desenvolvimentos mais profundos e elaborados entre o fazer e o pensar.
Trabalhar com a construção de conhecimentos a partir de projetos interdisciplinares suscita que se atente para os seguintes momentos: sensibilização; ativação de curiosidade; questionamentos; reestruturação da pergunta; pesquisa teórica e prática; categorização dos dados; análise; registro do que foi estudado e de um índice representativo dos diferentes conteúdos que será necessário aprofundar para compreensão do problema.
Um desafio muito grande para a maioria dos professores é trabalhar com projeto interdisciplinar aonde vai exigir momentos de pesquisas e buscas junto com os alunos de questões e dúvidas que aparecem no decorrer do caminho e muitas vezes o professor que não foi “acostumado” a trabalhar dessa maneira não tem mais paciência e interesse, por estar muito cristalizado com o trabalho feito com os alunos através de perguntas e respostas prontas do livro didático.
Outro questionamento da autora é sobre as atitudes que o professor assume nas relações que estabelece com seus alunos falando sobre a paciência e consideração que o sujeito manifesta no modo de estar-sendo-com-os-outros. Na relação pedagógica, ter paciência significa acreditar que o aluno é capaz de aprender e que tem seu tempo próprio para despertar e lançar-se no caminho da compreensão. Ele é diferente e requer maneiras diferentes de entender, compreender e apreender o conhecimento. Assim, o professor precisa dispor de um leque com variados elementos para que o aluno possa ser afetado e produzir-se enquanto ser-no-mundo.
Respeitar o tempo do aluno está longe da escola. O professor muitas vezes vê como falta de interesse do aluno ou até mesmo como um “problema” da criança em aprender determinado assunto que foi explicado em sala. O professor precisa perceber como o seu aluno aprende vigiando sempre o seu ritmo próprio, percebendo que hoje ele está assim e que a cada minuto o aluno avança no seu tempo. Não esperar passivamente, mas lançar vários recursos pedagógicos durante todo o processo prestando atenção na singularidade de cada um.
Se o professor se coloca na relação com o aluno e com o conhecimento numa atitude com eles e não para eles, necessário se faz a escuta, visto que, falar com carrega dentro de si o escutar para que a comunicação produza movimento e desencadeie o diálogo.
Ouvir deveria fazer parte do movimento da sala de aula, mas em muitos momentos o professor esquece que o aluno precisa ser ouvido para que as questões abordadas em sala sejam desafiadas e aprofundadas durante o diálogo. Simplesmente o assunto é respondido em questionários nos livros e muitos educadores se esquecem de perguntar para os alunos se entenderam ou até mesmo se gostariam de conhecer mais sobre determinado assunto, pois o conteúdo precisa se esgotar e não haverá tempo para conhecê-lo melhor e tirar as dúvidas que surgirão durante o caminhar do assunto.
A autora coloca que a sala de aula é local de encontros, de vida. Encontros com sujeitos singulares que desejam conhecer mais e melhor, desejam trocar, para ir ampliando seu referencial de mundo, de vida. Desejam encontrar-se consigo mesmo, com os outros, para formarem suas identidades, enriquecerem-se e construírem seus projetos de vida que são singulares, na coletividade. Portanto, sala de aula é espaço de relações dialógicas, espaço de comunicação.
Sábio Charles Chaplin com sua frase citada no início deste texto, pois novamente ela vem de encontro com as ideias do parágrafo acima. Se muitos professores não deixarem de agir como máquinas desreguladas passando conteúdos e seguindo currículos extensos, fora do contexto da sala de aula não conseguiram atingir o sentido mais pleno da educação que é saber utilizar do conhecimento adquirido em sala de aula na vida em sociedade, sabendo que ele não é algo pronto é acabado, mas que está em constante transformação e que vai se reconstruindo na história.
                                                              Rosania Soares carminati   

sábado, 27 de agosto de 2011


CONSELHO DE CLASSE: REFLEXÃO DA PRÁTICA PEDAGÓGICA



Rosania Soares Carminati

RESUMO


O eixo reflexivo deste artigo é o Conselho de Classe enquanto espaço legitimador de discussão e avaliação do aproveitamento dos alunos e da turma como um todo. O Conselho Participativo estimula o diálogo, fortalece o senso crítico, pois ajuda os alunos e professores a verem a realidade na qual estão inseridos pela visão do outro e modificar o processo pedagógico. O objetivo principal do artigo bibliográfico aqui apresentado é repensar a estrutura do Conselho de Classe como espaço diagnóstico da prática educativa. O estudo foi realizado para dar mais sentido ao processo de avaliação que a escola desenvolve vendo o aluno como um todo, além das notas ou conceitos. Todo o estudo foi conduzido aprofundando e refletindo conceitos lidos sobre Conselho de Classe e observações feitas durante a realização dos Conselhos na escola na tentativa de ajudar a construir uma nova visão ao processo de avaliação da prática educativa.


Palavras-chave: Avaliação. Diálogo. Prática Educativa. Espaço Diagnóstico. 


1 INTRODUÇÃO

 
Como se realiza o Conselho de Classe nas escolas sempre me chamou atenção e me provocou muitas reflexões. Pensar um Conselho de Classe como reflexão pedagógica em que professor e aluno se situem conscientemente no processo que juntos desenvolvem e não apenas como um espaço burocrático de entregar notas dos alunos à coordenação.
O Conselho verifica se os objetivos, processos, conteúdos e relações estão coerentes com o referencial de trabalho pedagógico da escola. Sob esse ponto de vista, ele é uma forma de avaliação, de controle da realização da proposta pedagógica. (PERRENOUD, 1998).
O conselho de Classe cumprirá sua função se realmente ajudar professores e alunos a reorientar sua ação pedagógica para a próxima etapa do trabalho na escola e não apenas para classificar os alunos.
O trabalho aqui apresentado buscará refletir sobre o Conselho de Classe como espaço de avaliação do trabalho individual e coletivo da equipe de professores e da coordenação pedagógica sobre seu próprio trabalho. Pensar também na participação do aluno representante durante a primeira etapa do Conselho de Classe como sujeito principal do processo educativo. A intenção é proporcionar um espaço de reflexão sobre o trabalho que está sendo realizado e possibilitar a tomada de decisão para um novo fazer pedagógico, favorecendo mudanças para estratégias mais adequadas à aprendizagem de cada turma ou aluno.
Na busca da solução de algumas observações feitas durante a participação dos Conselhos de Classe na escola aumentou o interesse pelo aprofundamento teórico sobre o tema citado acima para conhecer a origem do Conselho de Classe e entender o porquê de tanta resistência de alguns professores em querer o modelo de Conselho que aí está. A pesquisa feita esclareceu alguns pontos e fortaleceu outros, como a participação de alunos no pré-conselho e a maneira que se faz a avaliação sobre uma parte e não sobre todo o processo de ensino, pois nos Conselhos não se analisam as práticas dos professores, mas tão somente as do aluno.
Muito ainda precisa ser fundamentado e discutido para que o professor entenda que o conselho deve refletir a ação pedagógico-educativa e não apenas focar as notas, conceitos ou problemas de determinados alunos.


2 O QUE É CONSELHO DE CLASSE?


Embora o Conselho de Classe tenha surgido na França (ROCHA, 1984) e sua implantação no Brasil, inicialmente tenha sido voluntária e depois determinada por portarias e deliberações a fim de avaliar o resultado do aluno de forma coletiva, ainda hoje esse Conselho, embora teoricamente deva servir a este propósito, o que se observa é outra perspectiva.
Os Conselhos de Classe, em muitas escolas, tem-se constituído em espaço legitimador da exclusão dos alunos das classes populares da escola. Rocha (1984) conceitua o conselho de classe como uma reunião dos professores da turma com múltiplos objetivos, entre outros destacamos: avaliar o aproveitamento dos alunos e da turma como um todo; chegar a um conhecimento mais profundo do aluno e promover a integração dos professores e de outros elementos da equipe da escola.
Porém, as escolas reduziram o Conselho de Classe a uma reunião em que apresentam as notas/conceitos que os alunos obtiveram durante o período e se discutem as questões de disciplina das turmas. As reuniões do Conselho de Classe devem ser entendidas como fonte de informações, como acréscimo de conhecimentos que auxiliarão o educador na compreensão do processo de aprendizagem.
Cruz (1995) vai um pouco mais além. Aproxima o conceito de Conselho ao conceito de avaliação. Assim, o Conselho de Classe é o momento de uma avaliação diagnóstica da ação pedagógico-educativa feito pelos professores e alunos em momentos distintos, às vezes à luz do Marco Operativo da Escola. (CRUZ, 1995, p. 117).
O conceito apresentado por Cruz traduz dois momentos importantes. O primeiro é que o Conselho de Classe é um momento de avaliar diagnosticamente o trabalho coletivo a partir de um referencial e em determinado tempo. O segundo é que ele deve subsidiar as ações e o Projeto Político Pedagógico, onde no marco operativo estão descritos os objetivos que se pretende alcançar. Portanto, é uma reflexão conjunta da ação pedagógica na vida da escola.
Democraticamente orientado, o Conselho de Classe pode reforçar e valorizar as experiências praticadas pelos professores, incentivar a ousadia para mudar e ser instrumento de transformação da cultura escolar sobre avaliação. É o momento, o espaço de avaliação diagnóstica da ação educativa da escola, feita pelos professores e pelos alunos, à luz do Projeto Político Pedagógico.
Libâneo (2004, p.303) também define Conselho de Classe como um órgão colegiado composto pelos professores da classe, por representantes dos alunos e em alguns casos, dos pais. É a instância que permite acompanhamento dos alunos, visando a um conhecimento mais minucioso da turma e de cada um e análise do desempenho do professor com base nos resultados alcançados. Tem a responsabilidade de formular propostas referentes à ação educativa, facilitar e ampliar as relações mútuas entre os professores, pais e alunos, e incentivar projetos de investigação.
Libâneo (2004), como os demais autores aqui citados conceituam o Conselho atentando para a responsabilidade que este órgão colegiado tem de formular propostas com base educativa que garantam uma relação cordial entre professores, alunos e pais.
“À medida que se concebe a avaliação como um compromisso de futuro, o olhar para trás deixa de ser explicativo ou comprobatório e transforma-se em ponto de partida para a ação pedagógica.” (HOFFMANN, 2002).
O Conselho de Classe é uma reunião avaliativa em que as pessoas envolvidas no processo ensino aprendizagem discutem acerca da aprendizagem dos alunos, o desempenho dos docentes, os resultados das estratégias de ensino empregadas, a adequação da organização curricular e outros aspectos referentes a esse processo, a fim de avaliá-lo coletivamente, mediante diversos pontos de vistas.
É uma oportunidade de reunir professores com o objetivo de refletir sobre a aprendizagem dos alunos e o processo de ensino.


3 QUE ESPAÇO É ESSE?


Os alunos são considerados como tendo alcançado êxito ou fracasso na escola porque são avaliados em função de exigências manifestadas pelos professores ou outros avaliadores, que seguem os programas e outras diretrizes determinadas pelo programa educativo. (PERRENOUD, 1999).
O espaço que deveria ser o mais rico de transformação da prática pedagógica e, talvez, dos mais mal aproveitados nas escolas é o conselho de classe. Transformando-se apenas em julgamento dos alunos, sem direito à defesa e em espaço de críticas improdutivas sobre a prática pedagógica. O conselho de classe deveria ser uma etapa do processo de avaliação, podemos dizer que o Conselho de Classe é a avaliação que a escola pratica no dia a dia. O Conselho de Classe tem obrigação de ver o aluno como um todo, muito além das notas/conceitos.
O diálogo deve ser entendido como algo que faz parte da própria natureza histórica dos seres humanos. É parte de nosso progresso histórico, do caminho para nos tornarmos humanos. O diálogo é o momento em que os humanos se encontram para refletir sobre sua realidade tal como fazem e refazem. (SHOR; FREIRE, 1986).
O que não se encontra na maioria dos Conselhos é o diálogo, falar sobre o aluno, as análises feitas são superficiais. Os professores têm centrado suas atenções quase que apenas na constatação dos problemas disciplinares. Ainda é pequena a discussão sobre por que os estudantes não aprendem, onde se situam as dificuldades, que causas individuais e/ ou coletivas provocam as dificuldades de aprendizagem. Raramente nos Conselhos de Classe se discutem situações em que as causas estão no tipo de conteúdo, na metodologia, nos processos de avaliação, nas relações entre professor-aluno.
Repensar o conselho de classe é dar sentido e coerência ao processo de avaliação que a escola desenvolve e ajudar a mudar-lhe a prática educativa. A maioria das escolas reduziu o conselho de classe a uma reunião em que se apresentam as notas ou conceitos que os alunos atingiram durante o período e também se discutem as questões de disciplina das turmas.
Há certas crenças e valores no cotidiano de nossas práticas de que não abrimos mão. Não as questionamos nem em reuniões pedagógicas, nem sequer em conselhos de escola. Lembro-me de uma dessas reuniões de conselho de escola, discutíamos se dois alunos, bons alunos, estudiosos, deveriam ser reprovados porque estavam fracos em uma matéria, mas muito bons no resto. Terminamos concordando, passariam. A reunião ia ser encerrada e me atrevi a perguntar, e os outros? Que repitam, foi a resposta unânime. Tentei defender que todos passassem, ponderei com teorias pedagógicas, psicológicas, humanitárias, apelando aos direitos da infância e da adolescência... (ARROYO, 2009).
É interessante observar como professores com uma visão mais ampla de avaliação começam a questionar, nos Conselhos, as práticas de avaliação da escola. Pedindo muitas vezes para deixar o conceito em aberto para que ele possa avaliar o aluno melhor no bimestre seguinte partindo do pressuposto de que o aluno não é um sujeito pronto, acabado e que se constrói a todo o momento e isso pode ser positivo, pois pode sinalizar que o professor está em processo de construção de um juízo e não quer se precipitar na avaliação.


4 O CONSELHO DE CLASSE COM A PARTICIPAÇÃO DOS ALUNOS


Para Sant’Ana (1995) o Conselho de Classe é a atividade que reúne um grupo de professores da mesma série, visando em conjunto chegar a um conhecimento mais sistemático da turma, bem como acompanhar e avaliar o aluno individualmente, através de reuniões periódicas.
A avaliação escolar e o Conselho de Classe são elementos para que ocorram mudanças na luta pela democratização do espaço escolar. A escola precisa estar comprometida com os reais interesses da população, ou seja, que promova seu reconhecimento, valorização e conhecimento mútuo, o compromisso com a aprendizagem, respeito as diferenças individuais.
Penin (1992) escreve que o Conselho Participativo é um momento de diálogo e avaliação de todos os atores responsáveis pela formação do aluno, logo a escola pode e deve mudar as formas e condições do serviço prestado, conforme as necessidades dos alunos.
A ideia do Conselho Participativo não tem aceitação pacífica por parte dos professores, porque de fato vai possibilitar aos alunos maior participação no processo pedagógico. O que, em outras palavras, partilha o poder de decisão que durante toda a história da educação tem sido fonte de poder dos professores.
A polarização e criativa entre dois sujeitos que promovem e se confrontam se constroem e se destroem, se atraem e se repelem, este é o espaço educativo, político no âmago. Por isso, educação autêntica só pode ser educação política. (DEMO, 1988).
Penso o Conselho Participativo como o espaço de liberdade, de debate, de diálogo construtivo. É uma prática em que os alunos têm vez e aos poucos se soltam, crescem em visão política das práticas da escola e em seus comentários sobre a atuação dos professores. Para se falar bem, é preciso falar. Assim também para se saber criticar de forma correta e adequada é preciso que se possa criticar. É esse o espaço do Conselho de Classe.
5 QUESTÕES PRÁTICAS QUE PODEM SER CONSIDERADAS NUM CONSELHO DE CLASSE


Na tentativa de construir uma nova proposta ao processo de avaliação da prática educativa que se desenvolve no Conselho de Classe, foram elaboradas algumas questões que podem ajudar os professores, coordenadores e direção da escola no processo de avaliação da escola como um todo:
1-     Auto-avaliação dos profissionais da escola sobre seu trabalho pedagógico durante o bimestre ou trimestre;
2-     Análise diagnóstica das turmas;
3-     Proposta de ação individual e coletiva;
4-     Análise dos casos relevantes;
5-     Participação de um aluno escolhido pelo grupo no pré-conselho para debater os processos metodológicos, as relações entre alunos e professores. Sem a discussão de notas, conceitos, relatórios, mas o trabalho que se desenvolve em sala de aula.
As questões devem ser introduzidas na medida em que se vai tendo maior segurança e clareza. Ler atentamente a reação dos professores com cada etapa acima será de grande ajuda para a introdução de outras etapas. Cada questão deve ser bem observada e muita segurança para ser executada, só assim poderá avançar para outra questão e, sobretudo, firmeza na direção em que se processam as mudanças. 
Cruz (2005, p. 19) escreve que quem espera ter clareza total e segurança máxima para mudar, não quer mudar. Em educação não há estrada asfaltada. O caminho se faz caminhando e quem vai à frente se arranha e se espeta. Ou, se preferir ir pela água, estará nadando contra a corrente... 

 
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS


Esta pesquisa surgiu de uma preocupação com o Conselho de Classe, da necessidade de pensar o Conselho como reflexão pedagógica e não apenas disciplinar.  Através do aprofundamento teórico percebesse que o Conselho de Classe é um espaço de avaliação do trabalho individual e coletivo de todos que estão envolvidos no processo ensino aprendizagem.
Toda leitura feita foi de grande importância para aproximar a teoria da prática e melhor compreender a razão de ser do Conselho de Classe, dando a partir daí maior sentido e coerência ao processo de avaliação.
Para que comece a modificar a visão de Conselho de Classe praticado até os dias atuais é preciso dedicar-se e aprofundar algumas questões que ajudarão professor, coordenadores e direção da escola a promover ações concretas que possam interferir na prática educativa.
Toda pesquisa se voltou para o trabalho de entender o Conselho como uma etapa dinamizadora do processo educativo. Como nos diz Cruz (2005, p.15) em sua frase: “Avaliação realizada de forma participativa, como construção conjunta, cumpre a função de ajudar na formação da subjetividade e criticidade do professor e do aluno.”


7 REFERÊNCIAS


ARROYO, MIGUEL. Ofício de Mestre: imagens e auto-imagens. Petrópolis: Vozes, 2000.

CRUZ, Carlos H. C. Conselho de Classe e Participação. Revista de Educação AEC. Brasília, D.F.: AEC do Brasil, nº. 94, jan./mar 1995, p. 117.

______. Conselho de Classe: Espaço de diagnóstico da prática educativa escolar. São Paulo, S.P.: Edições Loyola, 2005.

DEMO, Pedro. Avaliação Qualitativa. São Paulo: Cortez, 1988.

HOFFMANN, Jussara. Avaliar para promover: As setas do caminho. 4.ed. Porto Alegre: Mediação, 2002.

LIBÂNEO, José Carlos. Organização e gestão da escola: teoria e prática. José Carlos Libâneo. 5.ed. Revista ampliada. Goiânia: Alternativa, 2004.  

PENIN, Sônia T. S. Educação Básica a Construção do Sucesso Escolar. Em Aberto, Brasília, nº. 53, 1992.

PERRENOUD, Philippe. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens – entre duas lógicas. Trad. Patrícia Chittoni Ramos. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.

SANT’ANNA, Iiza Martins. Por que avaliar? : Como avaliar? : Critérios e instrumentos. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

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